Na China eu precisei manter o sangue frio para ver algumas de minhas ações despencarem e ficarem ainda mais baratas do que já estavam. A guerra comercial entre China e EUA só piorava a cada dia e as notícias bombardeavam a cabeça de todos com dados “ruins” sobre a economia chinesa (a mídia faz questão de dar um tom dramático a tudo).
Quem me acompanha sabe que eu detesto ler noticiários, acho que isso nos torna investidores mais vulneráveis a tomar decisões por impulso. Porém, por mais que você tente fugir delas, o algoritmo das redes sociais empurra esses lixos todo o tempo na tela do seu celular. O que me restou foi colocar a cabeça no lugar, avaliar mais alguns balanços financeiros, buscar informações importantes para minha análise (essas não chegam até você espontaneamente).
Enfim cheguei à conclusão que por mais que o país estivesse desacelerando, o crescimento de 6% ao ano ainda era incrivelmente alto, coisa que quase nenhum país nesse mundo consegue entregar. Além disso, à medida que os balanços financeiros das empresas que eu invisto foram sendo divulgadas, percebi que elas ainda cresciam maravilhosamente bem e mantendo as margens do negócio intactas.
Decidi por focar todos os meus novos aportes nessa oportunidade que me parecia ser a melhor desde 2016/2017, ocorrida no mercado acionário brasileiro. É claro que falando de ciclos econômicos são momentos completamente distintos.
Em 2016 o Brasil tentava sair do buraco, enquanto nesse momento a China luta para não desacelerar de forma tão rápido (acho difícil a China voltar a crescer mais de 10% ao ano). Na verdade, eu estou me referindo ao nível de preços das ações e a capacidade que empresas terão de aumentar seus lucros no longo prazo.
Se as empresas parecem baratas para os níveis de lucro atual, imagina quando pensamos em lucros futuros de negócios que crescem 20% ao ano ou mais. Tente encontrar no Brasil, empresas que crescem mais de 20% ao ano. Vai contar nos dedos. Na China você usa os dedos das mãos e dos pés e não será suficiente.
Mais próximo do fim de 2019 os EUA amenizaram a tensão e as ações chinesas começaram a disparar novamente. Se eu tivesse deixado o medo tomar conta das minhas decisões eu não teria aproveitado as oportunidades e só começaria a investir depois que a guerra comercial terminasse. Como você já sabe, o mercado antecipa tudo, ou seja, no mar calmo as oportunidades já não seriam as mesmas. É isso que impede a maioria das pessoas de se tornarem investidores acima da média. Você deve ser agressivo quando todos estão com medo, é lá que possivelmente estão as melhores oportunidades.
Agora avaliando a minha trajetória de 2019 em relação à carteira brasileira, desde 2016 eu estava bastante posicionado em empresas de commodities, justamente pelo fato de estarem muito baratas e a maioria vinha de uma crise pesada por conta dos baixos preços das commodities, especialmente em 2014/2015. Elas foram as grandes responsáveis pela minha excelente rentabilidade em 2 anos consecutivos, entre 2016 e 2018. Ocorre que no início do ano de 2019 o cenário começou a mudar: os preços de algumas commodities começaram a cair novamente e as empresas voltadas ao mercado nacional começaram a se recuperar de formais contundente, aumentando receita e lucro e melhorando margens.
O único setor voltado ao mercado interno que eu havia me posicionado até então tinha sido o de construção civil, com Trisul e JHSF. Eu tinha também algumas empresas do setor elétrico e era o segundo setor mais representativo da minha carteira. O problema de você ter um portfólio com peso grande em ações mais estáveis como empresas de energia elétrica e saneamento básico, é que elas geralmente não são tão impulsionadas como as empresas cíclicas num momento de bull market. Eu precisava buscar por empresas de crescimento.
Eu demorei algum tempo para perceber que a maré estava virando para as empresas de commodity, mas depois disso eu comecei a estudar algumas empresas voltadas ao mercado interno e passei a ter um peso grande nelas na minha carteira de ações brasileira. Acredito que essa foi a melhor “tacada” do ano. Certamente meu desempenho teria sido pior se eu não tivesse reagido.
Por fim, acho que as principais lições de 2019 foram:
- Tenha controle emocional para tomar decisões racionais em momentos de alta tensão;
- Monitore o cenário econômico e as empresas que você investe e tome atitudes enérgicas quando necessário.
Pode parecer estranho para alguns, mas apesar de o mercado financeiro ser um lugar onde deve se prevalecer o controle emocional, ao mesmo tempo ele exige que você seja sagaz a fim de manter uma rentabilidade acima do índice. Você não pode ser passivo de forma alguma, a não ser que sua estratégia seja ser um investidor passivo com foco em investimentos em ETF. Aí é outra história. Ter a mente tranquila demais está a um passo da negligência.
Roberto Coutinho Machado